Geral 22 de outubro de 2024
O governo federal planeja uma ampla reforma administrativa, visando substituir o Decreto-Lei nº 200/1967, criado durante a ditadura cívico-militar (1964-1985) e que ainda regula a organização da administração pública federal.
De acordo com o Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos (MGI), o objetivo é adaptar a legislação à Constituição Federal vigente. Para isso, o MGI, junto com a Advocacia Geral da União (AGU), formou uma comissão de mais de dez especialistas, incluindo juristas, Servidores Federais, pesquisadores e acadêmicos.
O grupo tem até abril de 2025 para apresentar uma proposta de revisão do decreto-lei. Além da atualização da norma de 57 anos, o MGI publicou em agosto uma portaria (Portaria MGI nº 5.127) estabelecendo diretrizes para as carreiras no serviço público. Essa portaria define princípios e orientações que os órgãos federais devem seguir para reestruturar cargos, carreiras e planos.
“Este é o primeiro instrumento normativo desde a Lei 8.112 de 1990”, destaca José Celso Cardoso Jr., secretário de Gestão de Pessoas do MGI, referindo-se ao Estatuto do Servidor.
Em entrevista à Agência Brasil, Cardoso Jr. confirmou que “o governo federal já está implementando a reforma administrativa na prática”, com medidas infraconstitucionais adotadas desde 2023 para melhorar a estrutura e funcionamento da administração pública.
Entre essas iniciativas, ele cita o concurso público nacional unificado, o dimensionamento da força de trabalho e as novas normas para a política de desenvolvimento de pessoas como exemplos de que a reforma já está em curso.
A equipe de transição do governo federal anunciou em dezembro de 2022 a intenção de realizar a reforma administrativa. Especialistas afirmam que a reforma atual é mais abrangente do que a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 32, apresentada ao Congresso em 2020. A PEC foi aprovada por uma comissão especial, mas não avançou para votação no Plenário.
Segundo o cientista político Leonardo Barreto, “politicamente, não fazia sentido levar a PEC adiante naquele momento”. Michelle Fernandez, professora da UnB, reforça que a PEC 32 “nasceu obsoleta”, focando exclusivamente na redução de gastos, sem considerar o papel do Estado e dos Servidores Federais em atender à sociedade e implementar políticas públicas.
Sheila Tolentino, pesquisadora do Ipea e membro da comissão que discute a nova legislação, defende que a reforma administrativa deve priorizar a qualidade dos serviços prestados à população, e não apenas reduzir custos.
Representantes dos Servidores Federais alertaram a Comissão de Administração e Serviço Público da Câmara sobre os riscos da PEC 32, que poderia prejudicar a impessoalidade nas contratações e terceirizar carreiras essenciais em áreas como saúde e educação, além de dificultar investigações de corrupção conduzidas por servidores estáveis.
Entidades empresariais, como a Confederação Nacional do Comércio (CNC), defendem que a PEC 32 traria economia e ajudaria a reduzir a dívida pública. Porém, o sociólogo Félix Garcia Lopes Jr., pesquisador do Ipea, argumenta que essas visões fiscalistas são baseadas em premissas equivocadas, como o suposto aumento do gasto público com servidores.
Dados do Atlas do Estado Brasileiro (Ipea), da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) mostram que o Brasil possui cerca de 11 milhões de servidores públicos, representando menos de 13% dos trabalhadores do país, uma proporção inferior à média dos países da OCDE (20,8%).
Cerca de 60% dos servidores trabalham para prefeituras, enquanto 30% estão vinculados aos governos estaduais. Apenas 1,2 milhão de servidores, dos quais 570 mil estão na ativa, atuam no nível federal. A maior parte desse grupo é composta por professores universitários, enquanto os maiores salários estão concentrados no Judiciário e no Legislativo. Nos últimos cinco anos, o número de Servidores Federais civis tem diminuído.